Da série Contos de Gaveta:
(2)
Beleza
(Adriane Canan, Porto Alegre, 2001)
Pinta os olhos com força. Realça. Verde em todo o contorno. Em cima. Embaixo. O espelho é pequeno mas ela vê tudo. É de manhã cedinho. Os taxistas que vararam a noite ainda conversam alto na frente do Bar Carinhoso. Dois ou três restos de madrugada vagam pelo início do dia. Bêbados.
Agora coloca os brincos. Grandes. Vistosos. Dourados. Dá mais uma olhada no espelho. Uma olhada de cada lado. Bonito! Começam a passar os primeiros ônibus da manhã. Rápidos. Mais um dia começa naquela esquina.
Depois de seis anos morando num abrigo, ela decidiu procurar a rua. Cansou da cara das pessoas, cansou do lugar.
Ela era realmente um doce de pessoa, só queria descobrir outras coisas. Acordou mais cedo um dia, talvez uma segunda-feira, juntou um saco plástico, uma muda de roupa, um estojo de maquiagem que ganhara de uma amiga. E só. Saiu como quem sai de passeio, como quem sai por aí.
No começo ela foi procurada. Mas por pouco tempo. Buscou um lugar fixo, só para dormir. Encontrou uma calçada, uma calçada movimentada, um cantinho perto da porta do Bar Carinhoso, que enchia de gente nas noites de pagode. Ali se sentia acolhida, menos só.
O barulho começa cedo da manhã na esquina. No meio das coisas estendidas na calçada ela procura o vestido preto. Acha. Tira a roupa amassada da noite mal dormida. Coloca o vestido amassado, tirado do saco de suas poucas coisas. O fecho fica aberto. Está quebrado. Passam pela rua dois rapazes que trabalham na padaria.
O sapato é daqueles de plástico. Fáceis de colocar, ainda mais com duas tiras cortadas. Aquelas que apertavam muito. Está pronta. Junta os pertences do chão. O saco preto tem bastante espaço. Como travesseiro ela costuma usar uma blusa velha de lã. Daí é só dobrar e ensacar.
Pinta os olhos com força. Realça. Verde em todo o contorno. Em cima. Embaixo. O espelho é pequeno mas ela vê tudo. É de manhã cedinho. Os taxistas que vararam a noite ainda conversam alto na frente do Bar Carinhoso. Dois ou três restos de madrugada vagam pelo início do dia. Bêbados.
Agora coloca os brincos. Grandes. Vistosos. Dourados. Dá mais uma olhada no espelho. Uma olhada de cada lado. Bonito! Começam a passar os primeiros ônibus da manhã. Rápidos. Mais um dia começa naquela esquina.
Depois de seis anos morando num abrigo, ela decidiu procurar a rua. Cansou da cara das pessoas, cansou do lugar.
Ela era realmente um doce de pessoa, só queria descobrir outras coisas. Acordou mais cedo um dia, talvez uma segunda-feira, juntou um saco plástico, uma muda de roupa, um estojo de maquiagem que ganhara de uma amiga. E só. Saiu como quem sai de passeio, como quem sai por aí.
No começo ela foi procurada. Mas por pouco tempo. Buscou um lugar fixo, só para dormir. Encontrou uma calçada, uma calçada movimentada, um cantinho perto da porta do Bar Carinhoso, que enchia de gente nas noites de pagode. Ali se sentia acolhida, menos só.
O barulho começa cedo da manhã na esquina. No meio das coisas estendidas na calçada ela procura o vestido preto. Acha. Tira a roupa amassada da noite mal dormida. Coloca o vestido amassado, tirado do saco de suas poucas coisas. O fecho fica aberto. Está quebrado. Passam pela rua dois rapazes que trabalham na padaria.
O sapato é daqueles de plástico. Fáceis de colocar, ainda mais com duas tiras cortadas. Aquelas que apertavam muito. Está pronta. Junta os pertences do chão. O saco preto tem bastante espaço. Como travesseiro ela costuma usar uma blusa velha de lã. Daí é só dobrar e ensacar.
Toca o sino da Igreja da Sagrada Família. Sete horas. Ela sai para procurar o café da manhã. Vai voltar lá pelas seis da tarde, deixa dito aos taxistas que têm ponto na frente daquela esquina.
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