Monday, December 11, 2006

“No lo miraria en los ojos”

11 de setembro de 2001. No dia em que as atenções do mundo se voltavam para o atentado em NY, aqui, na América Latina, o Chile lembrava os 28 anos do Golpe Militar que derrubou o governo socialista de Salvador Allende. Um golpe que derrubou a esperança.

O Chile lembrava os milhares de mortos e desaparecidos sob o peso da ditadura de Augusto Pinochet. Lembrava de gente como o músico Victor Jara, que teve os dedos das mãos e a língua cortados. Victor não poderia mais cantar e tocar Te recuerdo Amanda. Victor não queria la patria dividida...Victor foi calado e morto!

Em 11 de setembro de 2001, eu trabalhava na Fm Cultura, rádio educativa de Porto Alegre. Preparamos uma matéria, eu e o colega Germano Maraschin, sobre os 28 anos do golpe. Era uma entrevista com Patrícia Verdugo, jornalista que escreveu o livro “A caravana da morte”. Foi este livro um dos principais fundamentos com os quais o juiz espanhol Baltazar Garzón abriu processo contra Pinochet. Patrícia teve o pai morto pela ditatura. Patrícia diz, na entrevista, que não olharia Pinochet nos olhos, pois tem a sensação de que o terror das vítimas sempre fica preso nos olhos do assassino:“Yo no lo miraria en los ojos”.

A matéria já estava pronta para ir ao ar no programa Cultura na Mesa, ao meio-dia daquele 11 de setembro de 2001, junto com diversas outras. E os aviões explodiram contra os prédios. No jargão jornalístico, “derrubamos” tudo que estava previsto para o programa e passamos a pensar a cobertura dos atentados. A única matéria prévia que colocamos no ar foi, exatamente, a dos 28 anos do Golpe no Chile. Havia uma relação histórica, afinal, a ditadura chilena teve, desde o planejamento do golpe, o apoio irrestrito dos Estados Unidos da América. A história demonstrou.

Estive no Chile por três vezes na década de 90. Foram momentos inesquecíveis participando do Encontro Latino-Americano de Teatro Popular. Na periferia de Santiago, recebidos nas casas da população mais pobre, nos sentíamos felizes e percebíamos com clareza que ainda havia esperança, mesmo depois de 17 anos de uma ditadura absurda e sangrenta. Lembro das Hormiguitas, um coletivo de mulheres que trabalhavam juntas, desde o início da década de 70, desde Allende. Elas nos contaram muitas histórias.

Com o Pablo, companheiro chileno com quem dividi alguns anos, também aprendi muito sobre o Chile. Nossa filha se chama Amanda!

Hoje, quando o povo chileno volta às ruas. Hoje, quando o Chile despertou sem a sombra do ditador sanguinário que dizia que “nenhuma folha se move no Chile sem que eu me mova”, lembrei daquele 11 de setembro. E de cada amigo chileno. Das Hormiguitas...E pensei em minha filha Amanda e em Victor Jara!

Viva Chile libre!

Ouça aqui a matéria com Patrícia Verdugo!



(Se preferir, clique aqui para abrir ou baixar o arquivo com a entrevista.)

* A disponibilização da matéria em áudio contou com a ajuda grandiosa do amigo jornalista Alexandre Gonçalves! Gracias, hermano!


Charge do Frank Maia.

Que viva Chile, agora livre de Pinochet!
Por la memória de miles de muertos por la dictadura!!
Por Victor Jara!