Edgar era azul e bem querido
Chamava-se Edgar e era de um azul bem azul. Morava comigo e com Amanda, minha filha, que tinha então 4 anos, no Itacorubi, aqui em Florianópolis. Era o ano de 2003.
Um querido, o Edgar compartilhava nossas vidas e nossas aventuras. Se descíamos para brincar no gramadinho que ficava atrás do prédio, o Edgar ia junto. Ficava ali, na boa. Eu lendo um livro na minha cadeira de praia, debaixo da laranjeira. A Amanda espalhando brinquedos pela grama. Ele ali, tranquilão e azul. Dentro de casa, quando colocávamos o cd do Palavra Cantada a todo volume, ele dançava também. Era um querido, o Edgar.
Um dia, fomos viajar. Nós duas, não deu pra levar o Ed. Deixamos na vizinha, prédio ao lado do nosso, amiga de algum tempo. Seriam poucos dias.
Na volta, ligo para a amiga pra buscar o Edgar.
- Oi, voltamos. Posso passar aí e pegar o Ed?
- Oi, Adri. Olha, não vai dar agora...Estou fora de casa. Podes me ligar de noite?
Claro, eu respondi. Mas confesso: senti algo de estranho na voz da minha interlocutora.
A verdade é que se passaram três dias de telefonemas, desculpas e desencontros. E nada do Edgar voltar pra casa.
Era um final de tarde de sexta, quarto dia depois do retorno da viagem. Eu saí do trabalho e passei no "escritório", ali no Seu Zezinho, no Mercado Público, pra encontrar uns amigos. Estavam todos muito esquisitos. Houve um constrangimento geral, um ar cerimonioso demais para minha chegada. Fúnebre.
Espera: quem me conhece sabe que sou expansiva e que quando chego, em geral, os amigos me recebem rindo. Não foi assim naquele dia.
Sentei, pedi uma cerveja pro Pinga, filho do Seu Zezinho. Márcia e Cristina cochichavam. Sérgio Murilo mal olhava pra mim. Valci fumava olhando pro outro lado.
Explique-se: Cristina era, então, sogra da minha amiga que hospedava o Edgar. Algo de estranho acontecia.
Ouvi a Márcia dizer pra Cris: Melhor contar de uma vez, de sopetão.
A Cris me olhou, triste, e disse:
- Adri, a gente não sabia como te dizer, mas o Edgar morreu.
- Como?
- É, subiu no telhado.
Nisso toca o telefone. Era a Bianca, minha amiga hospedeira.
- Adri, é a Bianca. Desculpa, mas eu não conseguia te contar. Os livros da estante caíram e derrubaram o aquário...Quando cheguei em casa, ainda no dia que tu viajou, o Edgar tinha ido dessa pra melhor...
- Bianca! Não fica assim, isso acontece...
Todos na mesa me olhavam com cara de velório. Eu dei uma risada.
- Gente, eu amava o Edgar, mas se a morte dele serviu pra me mostrar o quanto vocês me consideram, ele foi por um bom motivo, né?
De noite, contei pra Amanda. Ficou tudo bem. Mostrei pra ela onde a Bianca tinha enterrado o Ed. Conversamos sobre a morte e tals. Ficou, realmente, tudo bem.
Beijo, Ed. Beijo, turma.
1 comment:
amei Adrei! que lindo conto!!
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